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Writer's pictureGabriel Toueg

Faculdade e redações: abismo entre dois mundos

Reproduzo aqui algumas coisas que escrevi no grupo Um foca na sexta no Facebook, no qual converso com os estudantes participantes do projeto (que, aliás, foi destaque nos últimos dias no portal Imprensa e no Observatório da Imprensa). A reflexão abaixo foi gerada por um texto no Terra sobre um estudo do Poynter Institute a respeito da educação em jornalismo, State of journalism education.

Faculdade de jornalismo

Não é novidade o distanciamento entre a formação acadêmica e o mercado profissional. Sempre digo isso e por esse motivo faço questão de falar a alunos de faculdades de jornalismo, em palestras e debates – é uma forma, ainda que seja um “trabalho de formiguinha” (como também é o UFNS) de ajudar os futuros colegas na inserção e na compreensão sobre o mercado de trabalho.

A pesquisa do Poynter é interessante. Mostra como acadêmicos e profissionais estão distantes em suas visões – o que é ainda mais cruel que estar distante em sua atuação. Preparamos mal os jornalistas para o mercado e não preparamos os jornalistas para ensinar – o resultado é: profissionais despreparados para o mercado e incapazes de ensinar jornalismo de forma didática. Cria-se, com isso, dois grandes grupos de professores nas nossas faculdades: os academicistas, que se concentram em teorias e dão voltas em torno de si mesmos, e os profissionais, que tentam levar o mercado para as salas de aula sem a didática adequada.


Quão importante é um diploma para a compreensão dos valores do jornalismo? (Clique para a íntegra do estudo)

Ninja e diploma de jornalismo. Nada tenho contra o fato de os Ninjas não serem jornalistas. Para mim, o jornalismo cidadão, inserido, conhecedor da realidade e dos assuntos que “cobre” é mais autêntico que o “tradicional”. Minha crítica ao Ninja é a mesma que faço à mídia tradicional, à grande imprensa quando só mostram um lado: também eles só apresentam uma versão e raramente (senão nunca) vão buscar a declaração oficial, conversar com as autoridades etc.

Se defendemos uma imprensa equilibrada, apartidária, limpa, imparcial e objetiva, é necessário que tenhamos um olhar crítico sobre o trabalho desenvolvido pelos Ninjas – que vão às ruas mas se bastam com isso.

Ainda sobre o diploma, discordo do pensamento do professor Eduardo Meditsch, ouvido pelo Terra. Há muito tempo as redações contratam profissionais de várias áreas – a Folha é o maior exemplo disso, mas não está sozinha. Na minha editoria (Internacional) no Estadão (onde trabalhei até dezembro), um dos melhores repórteres é internacionalista, nunca estudou jornalismo.


Quão importante é um diploma para habilidades na apuração de notícias? (Clique para a íntegra do estudo)

O desgaste no ensino de jornalismo, nos EUA (onde o diploma não é obrigatório!) ou aqui, ocorre porque ele está desalinhado com a realidade do mercado. Por isso na maioria dos países o diploma não é obrigatório – porque bons profissionais não são feitos de aulas de manejo de câmera ou de técnicas de entrevista ou fotografia, mas sim de seres humanos pensantes, com capacidade de analisar, entender, contextualizar (e nisso a faculdade de jornalismo no Brasil ainda é muito falha).

Tendo a concordar com a diretora do curso de comunicação da UFRJ, Ivana Bentes, que “sempre considerou a exigência do diploma uma ideia equivocada”. O argumento dela é simples: “cada vez mais os cidadãos estão habilitados para produzir informação relevante” – daí nasceu o jornalismo cidadão, com a participação do sujeito que tem a sorte de estar no lugar certo e na hora certa munido com um celular com câmera fotográfica e conexão com a internet!

Também concordo absolutamente com o fato de que “é preciso que o aluno aprenda com os conhecimentos teóricos e que os educadores se abram às experiências pós-mídias digitais”. De novo, a diretora da UFRJ: “São mundos complementares, não opostos. As universidades precisam sim reformular seus cursos, criar laboratórios e desengessar suas práticas”.

O texto do Terra fala ainda em uma “troca entre uma geração de professores analógicos e uma de estudantes digitais”. Eu sinceramente não vejo troca – vejo, isso sim, profissionais engessados em práticas antigas (e analógicas) e resistente em se render às tendências da revolução de produção e consumo de notícias. Daí o fechamento de veículos, a venda de jornais, a demissão em massa de jornalistas. Admiro quem sabe aprender com os “focas”, que nasceram digitais, diferente da minha geração (sempre conto que a Metodista tinha um laboratório com máquinas de escrever quando eu entrei, em 1997!) Estamos, sem dúvidas, em um momento em que eles podem ensinar a nós mais que nós a eles.

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